- PROGRAMA "DIÁLOGO ABERTO" -
Entrevistas sobre temas sempre importantes.
De segunda a sexta-feira, das 11 às 12 hs.
Produção: Terezinha Jovita
Apresentação: Regina Trindade
Ouça aqui: http://www.rtv.es.gov.br/web/player_radio.htm

terça-feira, 14 de setembro de 2010

"Chico Doido", "Dona Domingas" e outros mais...

À margem esquerda da avenida Jerônimo Monteiro (considerando a direção em que os carros trafegam), proximo à escadaria Maria Ortiz, no centro de Vitória, há uma estátua representando uma mulher usando trapos, tendo em uma das mãos uma vara com uma ponta fina, e às costas um saco como se estivesse cheio de pedaços de papel. É uma homenagem a Dona Domingas, uma catadora de papel que se transformou num desses conhecidos personagens das ruas das cidades. O mendigo "Zé Meleca" não ganhou uma estátua, mas vez por outra é lembrado por algum saudosista capixaba. 
Há poucos dias, alguém postou no Facebook uma fotografia mostrando um certo "Nenem Doido", que me parece ser um conhecido personagem das ruas de Cachoeiro de Itapemirim. A pessoa que postou a foto - a mesma pessoa que conseguiu fotografa-lo, disse que o encontrou (imaginem só) nas proximidades do Hospital da Santa Casa. Informou também que o tal homem, que ao que parece sofre de insanidade mental, pediu cigarros - e ele lhe deu dois. Inclui naquela postagem meu comentário revelando meu espanto por tal atitude: depois de tantas informações veículadas pela imprensa, pela TV, pela internet, etc., com depoimentos de médicos especialistas sobre todos os malefícios que o cigarro traz, alguém dá cigarros para um homem já cheio de tantos problemas e ainda acha que lhe fez um bem? Acho que cada um tem direito a ter opiniões diferentes e eu tenho que respeitar todas, mas também tenho o direito de usar milha liberdade de expressão, e expus o que penso a esse respeito.
Mas isto não é tudo. Algumas pessoas falaram de saudades de outros tempos em que "Chico Doido" andava pelas ruas cachoeirenses. Muitos demonstravam afeto ao personagem, mas diziam que achavam que ele já havia morrido, dado o longo período em que ele não tem sido visto por lá. 
Saudade de ver um pobre coitado perambulando pelas ruas, demonstrando insanidade mental? Espero que, enquanto ele estava desaparecido, pelo menos algumas dessas pessoas tenha se preocupado em saber onde ele estava, como estava, se o estavam tratando bem...
Não cobro perfeição de ninguém. Não tenho esse direito. Afinal, sou tal imperfeito como qualquer ser humano normal. Mas corre pelo Facebook uma discussão sobre o caso "Chico Doido" - e ele certamente nem sabe disto. A sociedade em que vivemos é mesmo assim. Dona Domingas envelheceu catando papéis nas ruas e praças de Vitória, viveu e morreu na miséria. Mas ganhou uma estátua. Uma homenagem a ela, ou apenas para que olhemos para aquela figura e pensemos: "Ela está perpepetuada na nossa memória depois de morta... já que em vida, quando ela precisou que se fizesse alguma coisa, ninguém fez nada por ela."
Otinho - outro famoso personagem de Vitória que imporvisava lindos versos quando se deparava com uma linda mulher - também foi outro desses sofredores. Não ganhou uma estátua para ser lembrado, mas ganhou um título: "o Poeta das Ruas". Vez por outra é citado em algum livro ou crônica. Chegou até a receber uma homenagem da Academia Brasileira de Letras. Mas viveu e morreu na miséria. 
E quanto a "Chico Doido"? Será que vai ter uma estátua pra ele? Lembrarão dele em alguma crônica?  O fato é que, embora Cachoeiro de Itapemirim não seja uma cidade tão grande, ele ficou desaparecido por um tempo, e teve gente que, ao ver sua foto, confessou que isto lhes trouxe "lembranças". Ou seja, o pobre homem ainda não morreu e já havia caído no esquecimento de muitas pessoas. Durante suas vidas, pessoas como ele, Dona Domingas, etc., são chamadas de doidas, são vistas como motivos para se ter medo, são constantemente vítimas de chacotas e piadinhas de péssimo gosto, ou entao tem sempre aquelas pessoas que os chamam de "coitados" ou "coitadinhos" - mas limitam-se apenas a isto.  Alguns ainda tem a sorte de serem beneficiados por uma ação realmente amiga de vez em quando. Mas depois, mesmo estes tem que se contentar apenas em ganhar estátuas e "doces lembranças".
Acho que vale lembrar, aqui, as palavras do já falecido compositor carioca Nelson Cavaquinho, contidas no texto de um de seus sambas mais famosos:

Me dêem as flores em vida.
O carinho e a mão amiga
para aliviar meus ais.
Depois que eu me chamar saudade,
não preciso de vaidade,
quero preces e nada mais. 

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